Alice chegou dentro do bagageiro do carro.
Nem a funerária preocupou-se em trazer para casa seu corpinho de sete meses.
Quando abrimos o caixão, já as outras crianças estavam em volta, com a chupeta na boca. Olhavam para ela como se fosse uma boneca. Não consigo imaginar o que elas pensassem: os adultos chorando e elas tranqüilas, de pé, olhando com curiosidade.
Talvez para elas a morte seja novidade. Para nós é costume: mais uma criança que não agüentou esperar.
Açailândia é uma rica cidade do interior do Maranhão, terra de empresas e negócios, investimentos e desenvolvimento. Nesse país das maravilhas, Alice devia esperar um pouco mais.
Desde quando nasceu, o médico pediu cirurgia de urgência para seu coração enfraquecido. Durante sete meses seus pais bateram muitas vezes à porta da secretaria de saúde em busca de um tratamento. E Alice ficou esperando sete longos meses, no barraco lá no fundo da rua Juazeiro, à beira do barranco. Não agüentou; faleceu uma semana antes da consulta que tanto aguardava.
A vida e o progresso, nessa cidade, correm em trilhos diferentes. A velocidade do lucro aumenta a cada dia; nesse mês começa oficialmente até a duplicação dos trilhos da Estrada de Ferro Carajás.
Tudo é muito rápido... mas essa manhã eu também parei, ao lado da família, olhando a vida correr embora e a resignação estagnar nas ruas dessa cidade.
Quantas outras crianças morrerão assim? Qual será o futuro desses pequenos de chupeta que olhavam admirados para a morte?
A maravilha que Alice mais espera nesse país é a indignação, a organização popular e a vida para todos!
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