Vida e Missão neste chão

Uma vida em Açailândia (MA), agora itinerante por todo o Brasil...
Tentando assumir os desafios e os sonhos das pessoas e da natureza que geme nas dores de um parto. Esse blog para partilhar a caminhada e levantar perguntas: o que significa missão hoje? Onde mora Deus?
Vamos dialogar sobre isso. Forte abraço!
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@dariocombo; Foto: Marcelo Cruz

mercoledì 7 gennaio 2009

Como os magos a caminho de Belém: o VIII Fórum Social Mundial



O FSM está batendo às portas da Amazônia.
A expectativa é de cerca de 100mil pessoas, vindo de muitos lugares do mundo e reunindo-se em Belém do Pará por 5 dias de troca de dons e experiências.
A narração dos santos reis magos volta a acontecer, atualizada numa nova Belém sedenta de vida e de justiça. Cada pessoa e povo vai trazer seu presente na partilha mais rica que a humanidade até agora conseguiu organizar. Estamos já na oitava edição desse encontro mundial em busca de um novo mundo possível, pacificado, sustentável e justo.

Ao todo, mais de 2.700 encontros contemporâneos irão pautar a grande assembléia dos povos: a maior parte dos eventos serão de matriz brasileira (quase 70%), a seguir destacam-se na ordem seminários e oficinas propostas por França, EUA, Espanha, Itália, Índia, Colômbia, ...

Os temas tratados serão os mais diversos, recolhidos em 10 eixos temáticos. O eixo mais rico de atividades propostas é aquele sobre politicas públicas (saúde, educação e trabalho), sinalizando quanto o modelo de desenvolvimento atual está esquecendo-se dos direitos básicos dos povos. Também destaca-se o eixo sobre a participação da sociedade civil organizada no controle social, alternativas de democracia e conselhos de direito: novas formas de protagonismo popular estão aos poucos afirmando-se nos quatro cantos do mundo, questionando os modelos ditos ‘democráticos’ e estabelecidos para a defesa dos interesses de poucos. Precisamos muito trocar experiências e capacitar lideranças nesse processo participativo de gestão dos bens públicos.

O primeiro dia do FSM será dedicado particularmente às dinâmicas, conflitos e alternativas panamazônicas. A esmagadora maioria dos eventos deve-se novamente à iniciativa brasileira (87%): o Brasil quer levantar sua voz e dar espaço à vida que pode brotar de suas entranhas, apesar das ameaças e violências externas e da cobiça dos próprios cidadãos e grandes empresas locais. Há um futuro para a Amazônia, e esse depende da aliança dos povos, mas ainda mais da atitude corajosa e decidida de nosso País verde e amarelo e dos parceiros da Pan-Amazônia!

Está afirmando-se cada vez mais, também através da rede articulada do FSM, o conceito de “Justiça Climática”, pelo qual “o peso dos ajustes à crise climática deve ser suportado por aqueles que historicamente foram responsáveis pela sua origem e não pelos que menos contribuíram e que, entretanto, na realidade atual, são as principais vítimas das mudanças climáticas. Uma solução justa à crise deve se confrontar ao problema do sobreconsumo no Norte e também entre as elites do Sul. O sobreconsumo está enraizado na dinâmica do capitalismo, que transforma continuamente a natureza viva em commodities sem vida, estabelecendo um enorme desperdício no processo. A desestabilização do clima é, portanto, intrínseca ao capitalismo”. 

Os povos indígenas serão os grandes protagonistas do primeiro dia de Fórum e de todo o evento de Belém. Uma Tenda Indígena e uma Tenda dos Povos da Floresta hospedarão dezenas de iniciativas propostas por eles.
Muitas oficinas tratarão da valorização da Amazônia, também em nível econômico, devido à necessidade de sobrevivência e inclusão dos povos que habitam essa macroregião. O desafio é desenvolver a agroecologia, o manejo florestal sustentável, o protagonismo das populações locais. Tudo isso constrasta abertamente com o impacto violento causado pelos grandes empreendementos, sobretudo da indústria da mineração e da energia. A campanha Justiça nos Trilhos, por exemplo, articula dentro do FSM uma reflexão e denúncia bem documentada sobre o impacto da Vale do Rio Doce no Brasil e em outras regiões do mundo: quais mudanças estruturais podem ser exigidas por essas grandes empresas a fim de garantir a sobrevivência dos povos dos biomas florestais?

Muitos outros temas atravessam o fórum mundial: alguns estão concentrados em grandes “tendas temáticas”: tenda da afro-negritude quilombola, tenda Cuba 50 anos da revolução, tenda Curumim-Erê para as crianças (cultura, ritmos, brinquedos), tenda dos direitos coletivos de povos e nações sem estado, tenda dos direitos humanos. Nessas últimas duas, poderão ser aprofundados temas urgentes e graves: não esqueçamos que o 27 de Janeiro, primeiro dia do FSM, é dia de memória da Shoá do povo hebraico; ocasião para os integrantes do Fórum denunciarem a violência atual contra o povo palestino, no meio da prudência diplomática e oportunista das principais potências mundiais.

Diga-se o mesmo em relação à atual criminalização dos movimentos brasileiros em defesa dos direitos humanos: a solidariedade do FSM possa reforçar a luta e a denuncia corajosa dessas testemunhas de paz.

Há também uma dimensão espiritual que perpassa todo tipo de luta: poderemos enriquecê-la no espaço inter-religioso e na tenda da coalizão ecumênica, bem como na tenda irmã Dorothy, onde fazer memória de todos os/as mártires que doaram a vida para que todos/as tenham vida.

Destacam-se, enfim, a tenda do trabalho (onde serão analisadas as causas e condições da atual crise econômica) e a tenda da reforma urbana, em busca de alternativas vivíveis para as enormes cidades do mundo, ainda em fase de crescimento.

Esse FSM chega num momento muito delicado da conjuntura mundial: abriu-se uma crise sistêmica que pode colocar em discussão o inteiro modelo de desenvolvimento. É o momento oportuno para forçar os grandes e pequenos da terra a buscarem juntos mudanças estruturais da economia, da política, da cooperação e das instituições internacionais. Não pode-se mais pensar em ‘socorrer os pobres’ tampando o sol com a peneira da ‘esmola humanitária’.

Talvez se abra uma brecha para uma profunda reforma do sistema neoliberal e da estrutura político-militar que o defende. Isso depende, em parte, da capacidade de articulação, intercâmbio e pressão institucional dos movimentos e grupos que voltarão do FSM.

Os próprios magos não ficaram em Belém: tiveram que voltar buscando um outro caminho, fora do alcance da violência de Herodes. Que os profetas de Belém do Pará, pequenos mas numerosos, possam enxergar e percorrer corajosamente esses caminhos!