Vida e Missão neste chão

Uma vida em Açailândia (MA), agora itinerante por todo o Brasil...
Tentando assumir os desafios e os sonhos das pessoas e da natureza que geme nas dores de um parto. Esse blog para partilhar a caminhada e levantar perguntas: o que significa missão hoje? Onde mora Deus?
Vamos dialogar sobre isso. Forte abraço!
E-mail: padredario@gmail.com; Twitter:
@dariocombo; Foto: Marcelo Cruz

lunedì 18 dicembre 2023

Aguçar o olhar e enxergar sinais de Paz

Paz!
A pedimos com força, neste período de Natal.
“O povo que andava nas trevas viu uma grande luz”, profetiza Isaías.
Para reconhecê-la, na escuridão de muitas situações, é preciso caminhar e aguçar o olhar.
Não ficarmos parados, anestesiados. Não nos deixarmos cegar por tantos brilhos sem horizontes.
Buscar, esperar, confiar, ouvir os pequenos sinais da realidade e do Espírito.
Seria bom viver o Natal assim, como uma peregrinação noturna, feita de silêncio, de oração e de escuta, de espera.
Este mundo aos pedaços nos pede isso, a começar pela querida Palestina, destruída e agonizante; pede-o também a Mãe Terra, que não aguenta mais o nosso modo de vida.

Também sentimos essa necessidade na vida quotidiana, nas dores e nas expectativas das nossas famílias. Um Natal em que possamos falar uns aos outros sobre esperança.
O que é que, apesar de tudo, nos mantém vivos e nos dá sentido?
Um Natal para chegar na profundeza desta busca... e assim não afundar.

De minha parte, compartilho algumas brechas de luz, como a organização dos movimentos populares e das pessoas em situação de rua, que aumentaram muito nos últimos anos: recentemente, a mobilização dessas pessoas conseguiu aprovar uma política pública federal para prevenir novas situações de abandono, para cuidar de quem estiver em situação de rua e para reconstruir perspectivas para sair dela.
O lançamento ocorreu no Palácio do Planalto, com o Presidente da República, diversas autoridades e vários representantes da população em situação de rua, no mesmo espaço.
Me faz pensar numa política com os pés no chão, do ponto de vista das calçadas e não apenas das grandes rodovias...

Nos próximos dias, a Comissão para Ecologia Integral e Mineração da CNBB visitará o povo Ka'apor, no Maranhão. Eles se veem cada vez mais invadidos pelo desmatamento, o garimpo, a mineração e as falsas soluções dos créditos de carbono. Os Ka’apor perderam a fé na proteção do Estado, mas estão se organizando como Guardiões da Floresta, coletivos de autodefesa que realizam monitoramento permanente de seus territórios e mapeamento participativo.
Me faz pensar numa Igreja que se torna rebanho, para aprender a ser pastora...

Nos últimos meses, no Equador, jovens estudantes, famílias e comunidades cristãs uniram-se num referendo histórico, que mobilizou milhões de pessoas e aprovou a escolha de deixar o petróleo no subsolo, na região amazónica de Yasuni, para preservar a sua biodiversidade.
Da mesma forma, no Panamá, o protesto popular – também apoiado pelos bispos, que saíram às ruas com o povo – conseguiu cancelar as concessões mineiras e evitar que o Estado se vendesse à voracidade das empresas predatórias.
Me faz pensar em novas formas de economia, decoloniais, que podem se afirmar quando as pessoas se organizam e se comprometem...

Enxergar sinais de luz ajuda a não nos perdermos. Quem sabe seja este o melhor presente para a noite de Natal? Menos coisas e mais sinais, de carinho, de partilha, de comunhão com a vida dos povos e da Terra.
Feliz Natal!

lunedì 30 ottobre 2023

Que jorre a paz como uma fonte e a justiça como torrente que não seca!

O mês de outubro tem sido dramático, pela grave crise da seca que atacou boa parte de nosso país e colocou em crise especialmente a Amazônia, e pelas fortes enchentes no Sul do Brasil.

A humanidade está de joelhos frente à emergência climática e a criação inteira está gemendo. Papa Francisco publicou, no dia de São Francisco, a exortação Laudate Deum, mostrando sem meias palavras quem são os responsáveis desta crise e quão urgente é colocar um limite ao poder econômico e aos países que mais estão poluindo.

Poucos dias depois, a guerra entre Israel e Hamas quebrou ainda mais este mundo “em pedaços”. Os apelos do Vaticano e da ONU não estão sendo escutados. Unimo-nos aos movimentos populares do mundo inteiro, que neste dia 4 de novembro irão descer às ruas, clamando pelo cessar do fogo, a abertura de corredores humanitários e a convocação de uma conferência de paz. Parem! A guerra é sempre uma derrota! – clama Papa Francisco.

Frente a situações tão complexas, a gente se sente impotente e isso provoca também um forte desânimo. Ou, mais facilmente, as pessoas se retiram em seu mundo individual, desistindo do compromisso por uma sociedade mais justa e na paz.

Por isso, queria brevemente trazer o testemunho de tantos cristãos-as e pessoas de boa vontade que, ao contrário, não desanimaram e continuam a trabalhar como formiguinhas, como artesãos e tecelãs da Paz.

Refiro-me aos muitos grupos, Brasil afora, que estão trabalhando na 6ª Semana Social Brasileira. Um percurso que começou 4 anos atrás e que está chegando à fase de conclusão, de encaminhamentos e ações. Antes, foi traçado um profundo diagnóstico sobre “O Brasil que temos”, focando no direito de todas as pessoas a Terra, Teto e Trabalho, conforme a missão que Papa Francisco deu às pastorais sociais e aos movimentos populares.

Agora que temos claro o diagnóstico, os mutirões da Semana Social, espalhados por todo o Brasil, estão construindo um Projeto Popular, que intitulamos “O Brasil que queremos: o Bem Viver dos povos”.

Outubro foi um mês intenso de trabalho nisso, porque precisamos chegar a março de 2024 com este projeto pronto e com uma lista de ações concretas, de transformação social e incidência política, que queremos assumir como Igreja e movimentos em todos os territórios.

“Que jorre a paz como uma fonte e a justiça como torrente que não seca!” – dizia o profeta Amos num versículo que inspirou o Tempo da Criação, concluído em outubro.

Que o trabalho formiguinha da Semana Social Brasileira consiga envolver mais e mais pessoas, porque a paz – ensina o Papa – se constrói a partir de dentro e de baixo!

giovedì 8 giugno 2023

Corpo de Cristo e dos indígenas

O pão partido é o símbolo que mais contrasta a tentação do poder, quase sempre bênção para quem acumula.
Este pão é Corpo de Jesus, consagrado hoje mais uma vez na celebração de Corpus Christi, na Esplanada dos Ministérios.
Na mesma Esplanada, nestes dias, cerca de mil e quinhentos indígenas, de diversos povos do Brasil, ficaram acampados, organizando seminários e debates, manifestações e danças circulares em busca da defesa de seus territórios, contra a tese jurídica do Marco Temporal.
Dois eventos profundamente interligados, que a vida religiosa celebra e acompanha com devoção e compromisso. A Eucaristia é presença viva do Deus que se faz carne e história no meio de nós. Nos corpos destes indígenas que deixaram suas terras, padecendo o frio das noites de Brasília nas tendas e clamando pelo direito à terra dos ancestrais, reconhecemos também o corpo ferido e humilhado de Jesus, como ensina o Evangelho de Mateus.
Pela fé, hoje, o povo de Deus reunido em celebração caminhará em procissão, como uma só família que busca vida plena. Com a mesma fé e esperança, nestes dias, os povos indígenas dançaram ritmando seus passos ao som do maracá.
Chamou-me a atenção a deputada indígena Célia Xakriabá: a sessão do debate na Câmara estava começando, mas ela fez questão de correr fora, ao encontro de seus parentes. Não teve tempo de dizer nada, nem um discurso breve; simplesmente, juntou-se à roda de dança, no ritmo que invocava a resistência dos ancestrais, no Toré, no Guachiré... Os povos indígenas dizem que é com as batidas dos pés destas danças que o mundo se mantém em equilíbrio.

A dureza da realidade, porém, corrói a intensidade desta mística.
O julgamento do Marco Temporal foi novamente adiado, pela quarta vez, em seis anos de um processo que os povos teimosamente não querem largar.
No campo religioso, muitas pessoas que celebram Corpus Christi se escandalizam quando são feitas aproximações como esta, entre o “sagrado” e o “profano”.
Mas o sagrado terá fronteiras, na Eucaristia cósmica (LS 236) que celebramos hoje?
Eu quero acreditar, com esperança, numa Igreja a caminho em busca de Jesus encarnado, ontem, hoje e sempre, nos corpos feridos e na fé profunda do povo simples, que comunga e que parte o pão.