Vida e Missão neste chão

Uma vida em Açailândia (MA), agora itinerante por todo o Brasil...
Tentando assumir os desafios e os sonhos das pessoas e da natureza que geme nas dores de um parto. Esse blog para partilhar a caminhada e levantar perguntas: o que significa missão hoje? Onde mora Deus?
Vamos dialogar sobre isso. Forte abraço!
E-mail: padredario@gmail.com; Twitter:
@dariocombo; Foto: Marcelo Cruz

domenica 28 ottobre 2018

Sentimentos e caminhos depois das eleições

Juntos nesses dias sonhamos, refletimos e dialogamos, tentamos resistir à onda de superficialidade, mentira, ódio e raiva que acabou dominando os debates.

As eleições deram seu veredicto, mas o clima de agressividade e violência pode perdurar, seja nas decisões políticas que poderão ser tomadas a partir de janeiro, seja no descontrole das pessoas nas relações do dia a dia.

Como Família Missionária Comboniana, inspira-nos o Coração de Jesus: ferido, aberto, não deixa de pulsar, não perde sua paixão, agrega-nos mais perto entre nós e aproxima-nos aos excluídos.

Ficam para nós algumas missões desafiadoras:

- voltar a falar de Deus purificando todas as manipulações. Convidar as pessoas a escutarmos sua voz de maneira mais profunda. Resgatar a profecia junto com a ternura, religar relações quebradas tentando honestamente contemplar o que nos sugere o Espírito;

- confirmar nossa opção pelos mais pobres e abandonados, a primeira das obediências que nos propõe a imitação de Cristo. Organizarmo-nos mais para protegê-los, consolidar as motivações evangélicas e a análise crítica do contexto que sustentam nossa opção;

- cultivar nossa humanidade, preservar a esperança, não ceder à banalidade do mal, não render-se à superficialidade ou à resignação. Conversar mais, dar mais tempo ao silêncio e à oração, buscar e compartilhar a beleza da arte, da amizade, das muitas maneiras para celebrarmos a vida.

Um grande abraço, retomando a caminhada de cabeça erguida, junto a nossas comunidades!

venerdì 12 ottobre 2018

Há esperança

É como se estivéssemos correndo na rodovia, em alta velocidade, próximos a uma bifurcação. Aparece aquela angustia de não errar o caminho, pois –uma vez escolhida a direção errada- não dá mais para voltar atrás.
No carro que corre, perguntamo-nos alarmados: como pudemos chegar tão rapidamente até esse ponto?
O Brasil está dividido, as eleições não são ocasião para disputarmos projetos de futuro ou refletirmos sobre caminhos possíveis. Prevalece o ódio à política, o voto em muitos casos é um grito de protesto, um hino de estádio, uma bomba aprontada para estourar tudo.
Uma deformação somática da sociedade brasileira leva muitas pessoas a pensarem com a barriga, enxergarem com olhos velados pelo medo, agirem com o ódio injetado no sangue.

Há séculos nossa sociedade está dominada pela divisão. O Brasil nasceu com a imposição colonial de um projeto de saque; desde então, para defender os privilégios de poucos, continuam sendo sacrificadas muitas pessoas.
Mas como é possível que tantos apoiem ainda hoje essa lógica sacrifical? Por que conseguimos tão pouco percorrer os caminhos de educação e libertação que Paulo Freire e seu movimento inspiraram?
O debate político e a formação da opinião pública, hoje, são fortemente influenciados pelos círculos de comunicação. Não se trata mais da comunicação linear que entrecruza pensamentos distintos, põe a confronto diversas leituras da realidade e pode levar as pessoas de um ponto de vista para outras interpretações da história.
A comunicação acontece cada vez mais entre grupos homogêneos, entre pessoas que partilham as mesmas ideias e que têm necessidade de sentir-se confirmadas por outros companheiros-as que as validem e reforcem.
Círculos impermeáveis, cada vez mais agressivos, que consideram o outro um inimigo. A campanha eleitoral de muitos candidatos se dá assim, reduzida a uma batalha de memes pelo whatsapp.
A escritora e jornalista Eliane Brum criou uma expressão específica para isso: da pós-verdade das fake news estamos passando à “auto-verdade”. Nessa nova lógica, o conteúdo não é relevante, é suficiente o ato de falar. Os acontecimentos, a verdade não importam. O simples fato de se manifestar com vigor, gritar e denunciar, propor soluções inviáveis mas populistas é considerado algo corajoso, honesto, autêntico. A estética, conclui Eliane, toma o lugar da ética.

Mas o que nos dá esperança, nessas horas?
Muitas pessoas que quebram os círculos virtuais e retomam a praça como lugar de presença, encontro, manifestação, de cabeça erguida. Os grupos onde ainda se fala olhando-se nos olhos, estudando um tema com respeito, tentando escutar-se reciprocamente. As comunidades eclesiais de base onde a fé se abraça com a história, a Palavra inspira a vida e por ela é iluminada. As pastorais e os movimentos sociais que continuam acreditando que fora dos pobres não tem salvação, para a Igreja e para o mundo, e seguem corajosamente ao lado deles. Fazem do serviço aos excluídos e da educação popular libertadora uma profecia, também para a política.

Entre as imagens de Brasil que não quero esquecer, nessas semanas de angustia, está aquela de milhões de mulheres que ocuparam as ruas no final de setembro. Marcharam de forma não-violenta e criativa, em muitas cidades do Brasil, para dizer não ao movimento fascista, racista e misógino que está se consolidando ao redor do candidato militar. Não defendiam um partido, tinham múltiplas pertenças e a coragem de manifestar.
Só a violência pode calar essa voz, e é isso o que está acontecendo. Pessoas agredidas, humilhadas, até mortas por terem afirmado sua crítica à sombra de ditadura que ameaça o País.
Estamos correndo em alta velocidade rumo a uma bifurcação. Se errarmos de caminho, não terá mais como voltar atrás.