Vida e Missão neste chão

Uma vida em Açailândia (MA), agora itinerante por todo o Brasil...
Tentando assumir os desafios e os sonhos das pessoas e da natureza que geme nas dores de um parto. Esse blog para partilhar a caminhada e levantar perguntas: o que significa missão hoje? Onde mora Deus?
Vamos dialogar sobre isso. Forte abraço!
E-mail: padredario@gmail.com; Twitter:
@dariocombo; Foto: Marcelo Cruz

mercoledì 31 ottobre 2012

Um Deus falso, mudo, sem coração


Encontrei o presidente da segunda maior mineradora do mundo.
16º andar de um prédio que cresce tão alto quantos profundos são os buracos que a empresa cava nos territórios e os impactos que deixa na vida das populações.

Lembrei-me de Moisés quando encontrou Faraó. Tremia a voz, mas a fala era firme, porque apresentava o sofrimento de um povo inteiro, escravizado, seduzido, enganado.
Faraó significa ‘Casa Grande’, centro do poder e do controle da economia e dos territórios.
Não há Casa Grande sem Senzalas. Não há riqueza acumulada sem consequências escondidas, ‘zonas de sacrifício’, impactos ‘inevitáveis e necessários’, que alguém deve sofrer para que muitos, supostamente, possam crescer.

O Deus de Moisés habita nesses retalhos de mundo sacrificados para a vida dos senhores da economia. Impulsiona, lá em baixo, a revolta organizada dos pobres.

O Deus de Faraó, que é um ídolo, para se manter em pé precisa da mentira. Não é uma mentira deslavada, nua, evidente. É a sedutora e disfarçada distância entre a propaganda, os ‘valores corporativos’, os ‘mantra da empresa’... e a prática real.

O Deus de Faraó, que é mudo, para se fazer escutar precisa de arrogância. Não é arrogância explícita, direta. É a violência simbólica de quem impõe seu poder em cima de comunidades que não têm elementos ou força para se contrapor.

O Deus de Faraó, que não tem coração, para se fazer amar precisa de sedução. Sedução feita de promessas raramente cumpridas, de milhões de dólares de marketing, de muita maquiagem que torna a empresa e o progresso bonitos de longe e fedidos de perto.

Como foi que Moisés e seu povo conseguiram afastar-se de Faraó e por-se a caminho em busca de uma nova terra, em construção permanente de novas relações e de uma nova sociedade?
Acho que a chave da libertação está nessa visita de Moisés à casa de Faraó: o israelita, mesmo gaguejando, não se deixou seduzir pela lábia de Faraó, não introjetou a fala do senhor do Egito e não desistiu do Deus frágil e pequeno que estava se manifestando aos escravos.

De alguma forma, intuiu e acreditou que havia mais verdade na voz daquelas vítimas e que a vida fazia mais sentido se vivida ao lado de seu próprio povo, e não na mansão de Faraó.

Moisés é cada um/a de nós que vivemos nas comunidades atingidas por esse modelo de desenvolvimento.
Todo dia sofremos a tentação que a lógica de Faraó conquiste nosso coração, ou um amigo nosso, uma liderança que de repente abandona o trabalho coletivo, a resistência, o povoado...

Libertação, ainda antes de sairmos da dominação, é não deixar entrar o dominador dentro de nós.

domenica 14 ottobre 2012

Missionários Combonianos na defesa da justiça ambiental


Outubro de 2012: o bispo dom Michele Russo, missionário comboniano, é expulso do Chade, um dos mais pobres países africanos.
Numa de suas homilias, desafiou o Governo a respeito dos lucros do petróleo: na opinião do bispo, não há transparência na destinação desse dinheiro, há suspeita de enriquecimentos ilícitos de poucos, enquanto os impactos socioambientais afetam a camada mais pobre da população.
O Governo do Chade considera que o missionário “se dedicou a atividades incompatíveis com seu cargo”.

Julho de 2012: no Peru, o responsável dos missionários combonianos por Justiça e Paz, pe. Juan Goicochea, denuncia centenas de conflitos socioambientais em seu país, ligados à resistência dos povos peruanos contra as empresas de mineração. Em três dias de violência na região de Cajamarca, houve 5 mortos e vários feridos. Outro padre, Marco Arana, foi preso e torturado. A igreja peruana negociou ativamente com o governo para encontrar uma saída no diálogo com as comunidades de Cajamarca.
Em novembro, uma delegação de Vivat (ONG dos missionários/as que denunciam na ONU as violações de direitos e buscam proteção às vítimas) visitará a região em solidariedade.

Brasil: na região mais rica do mundo em jazidas de ferro, Carajás, os Missionários Combonianos Brasil Nordeste estão desde 2007 denunciando inúmeras violações dos direitos socioambientais de povos quilombolas, indígenas, comunidades rurais e urbanas. A rede Justiça nos Trilhos, fundada pelos combonianos e outras entidades, depara-se a cada dia com diversos conflitos provocados pelos empreendimentos daquela que foi eleita ‘Pior multinacional do mundo’ em 2012, a mineradora Vale S.A.
Enquanto isso, o governo brasileiro continua financiando os investimentos de Vale e ‘abençoando’ seus planos agressivos de expansão.

As indústrias extrativas de minérios e petróleo estão intensificando mundialmente seus investimentos e grandes obras, para aproveitar em poucos anos, a um ritmo violento e arrasador, da conjuntura favorável de preços e necessidade de matérias primas.
Em muitas regiões do mundo, o boom da extração passa por cima dos direitos das comunidades locais, agride o meio ambiente e os equilíbrios até então estabelecidos nos ritmos e relações tradicionais de existência. Os governos locais apóiam essa política econômica ditada por grandes multinacionais, iludidos que o ‘progresso’ que se instala nas regiões ricas de jazidas seja permanente e instale um ciclo progressivo de crescimento.
Até prova contrária, o destino de todo projeto extrativo foi abandonar os territórios logo que aparecer escassez de recursos e transferir os investimentos em novas regiões a serem agredidas. Para as populações locais só sobram buracos e os elefantes brancos de infraestruturas e cidades construídas no momento de pique da produção.

Desde sempre, os missionários dedicaram-se à vida e libertação dos mais pobres e abandonados.
Cristo ressuscitado os envia e espera no meio das vítimas, para que, reconhecendo-o presente, os pobres levantem a cabeça e a voz e reconstruam relações à medida de seus sonhos.

Observando esses grandes empreendimentos extrativos, os missionários reconhecem que há neles uma cínica forma de ‘racismo ambiental’: as vítimas dos impactos socioambientais são sempre os mais pobres e excluídos. Os povos do sul do mundo, onde são instalados os projetos mais agressivos e poluentes; as comunidades das periferias urbanas, que recebem os descartes da produção e convivem diariamente com o lixo do progresso; as populações indígenas, quilombolas e os pequenos produtores rurais, que acabam sendo cada vez mais isolados pelo avanço do desmatamento, da concentração das terras, da exploração de minas e jazidas.

Enfrentar o racismo ambiental, em nome de Cristo ressuscitado, inverte os padrões de crescimento e futuro e impele os missionários/as a tomarem posições cada vez mais corajosas: não à agressão descontrolada das indústrias extrativas, não à cumplicidade dos estados para um progresso que continuará a ser de poucos. Sim à vida das comunidades que determinam sua própria gestão dos territórios, dos bens e do futuro.
Essa nos parece ser uma nova leitura das bem-aventuranças de Jesus no mundo faminto de hoje.