Uma leitura de Mc 6, 30-34
Há uma chave que abre os textos da Palavra de Deus. Às vezes a gente lê e volta a ler, sem que o Evangelho nos diga muito... e de repente encontra-se uma chave que desvenda um sentido novo e rico.
Há uma chave que abre os textos da Palavra de Deus. Às vezes a gente lê e volta a ler, sem que o Evangelho nos diga muito... e de repente encontra-se uma chave que desvenda um sentido novo e rico.
O mais interessante é que essa mesma chave abre também nosso coração, revela necessidades, sentimentos, sonhos ou intuições talvez inconscientes e escondidos, que a Palavra de Deus 'cotucou' e despertou. É nesses casos que sentimos a Bíblia tão perto de nossas existências, fio de costura de nossas ações e escolhas.
Minha palavra chave, no texto do Evangelho desse domingo, é “Amizade”.
O trecho imediatamente antecedente narrava a perda de uma grande referência para Jesus: João Batista condenado e executado brutalmente. É o momento em que Jesus cai em si, entende que chegou a sua hora, endurece o coração e se decide a enfrentar até o fim a cumplicidade entre hipocrisia e violência no poder religioso/político.
Mas, dentro de si, Jesus deve ter sentido frio e uma grande necessidade de amigos, companheiros, apoio.
Bem nessa hora os discípulos voltam da missão, celebrando a beleza de um envio de dois em dois, o orgulho de uma missão cumprida, o desejo de partilhar as coisas boas com o amigo e mestre que os enviou. E Jesus os convida a ficar um pouco sozinhos, num lugar deserto, para fortalecer nos laços de amizade tudo o que a vida ensinou e renovar alianças para enfrentar a injustiça.
Quanto fazem falta, às vezes, momentos como esse, de verdade e profunda humanidade, em que a gente renova o compromisso, desce até as motivações mais íntimas e verdadeiras de nossas escolhas e descobre que são as mesmas que animam nossos amigos!
Esses elos são mais fortes de qualquer decepção, de toda violência que a realidade pode cuspir em nossa cara. Mais resistentes da distância que nos separa ou do tempo que tenta apagar os marcos de referência de nossa vida.
Se conseguimos manter viva essa ligação profunda com nossos amigos, criar e recriar ocasiões e espaços para que ela se cultive e desenvolva, iremos nos “salvar” (que é o contrário de se perder, desorientados na correria sem rumo das urgências da vida ou na rotina acinzentada do dia-a-dia).
Trata-se uma necessidade coletiva, pelo que segue no texto do evangelho: “muitos os viram partir e correram a pé em busca deles”. Nesse trecho Marcos não relata de doentes em busca de cura ou endemoninhados procurando libertação: só fala de gente procurando um rumo, ovelhas sem pastor sedentas de palavras de vida, ilhas em busca de relação e compaixão (que é a capacidade de “sentir juntos” o que é mais profundo).
Na grama verde daquele lugar, Jesus mandará todos sentar e formar grupos para a partilha; a tarde toda, ensinando, dirá que sua religião não é mais de servos, hierarquias, obediência e temor, mas de amizade, utopia, aliança de sangue e paixão.
2 commenti:
Concordo em tudo com o seu pensamento. Estou sempre a espera de um novo post. Obrigado!
Querido Dário,
Que palavras doces e bonitas, penso ainda que a mensagem importante que fica é que tudo na vida deve ser cultivada e cuidada. Por mais fortes que sejam os laços afetivos eles precisam ser ditos, sentidos e vividos.
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