Assim, em nossos encontros comunitários, nos intercâmbios e nas formações populares, Anacleta provocava: quem? Como? Quando?
E ela era a primeira a puxar o grupo, como foi nos longos dias de ocupação da ferrovia, para bloquear o dragão de ferro da mineração: povo quilombola acorrentado nos trilhos, um gesto paradoxal de liberdade e rebeldia.
Anacleta é uma mulher-povo, em volta dela se moviam pessoas, lutas e sonhos. Comovia-se pela dor dos outros e entendia muito bem que a liberdade só tem valor se for de todas, de tudo.
Chorava em seu lamento, somando-se como quilombola aos povos indígenas em marcha. Quando a Câmara Federal humilhou a causa indígena e aprovou o marco temporal, ela estava lá, na Praça dos Três Poderes, junto aos “irmãos índios”; passou à frente de todos e entoou um longo canto de luto e de luta, renovando a aliança da teia dos povos.
Caixeira do Divino Espírito Santo, celebrava a vida no grande círculo de sua família; nos intercâmbios das comunidades, ritmava no canto e na batida suas mensagens de resistência: “Não nasci para ser mansa. Ah! Eu tenho meu dom de braba!”.
Já quando o corpo estava mais frágil, seus versos eram de memória e cuidado: “São os chiados das flores e o canto do pássaro / a pisada no chão e as ondas do mar / que me ensinam a cantar / Agora é tempo é de cuidar”.
Agora que você se ancestralizou, é tempo de cuidar de nós, dona Anacleta: de Santa Rosa dos Pretos, dos quilombos do Maranhão e da “humanidade quilombola” na qual você segue vivendo!